quinta-feira, 10 de julho de 2008

Metas de Inflação, Selic e ineficiências - um complemento pós-keynesiano

Em relação ao excelente artigo de Matheus, intitulado: “Metas de inflação, SELC e ineficiência”, postei em seu blog um comentário visando complementar a idéia de eficiência, do ponto de vista pós-keynesiano. Porém, acabei por deixar de explanar um sério assunto a respeito da ineficiência da política de matas de inflação. Começarei reproduzindo o comentário, para vossa ciência:

“A ineficiência de uma política monetária restritiva, no atual contexto inflacionário brasileiro tem origem em dois aspectos importantes que são: a característica da inflação e a característica dos títulos utilizados para a realização desta política.

Primeiro: a inflação brasileira é do lado da oferta. Abaixo do produto potencial, políticas monetárias restritivas tendem a dificultar o crédito. Para o empresário, isto significa menores vendas ( o consumidor não encontra crédito barato e facilitado) e maiores dificuldades em investimentos. Quanto aos investimentos, se dá pela inviabilização econômica dos mesmos (TIR dos projetos abaixo da taxa de juros do empréstimo são, na verdade prejuízos eminentes) e pelo fato de o empresário não poder repassar este juro mais alto aos preços, sob pena de perder mais mercado, já que os consumidores estão "deixando de consumir" por causa das altas taxas.Enfim, o empresário deixará de investir, por não poder aumentar os preços e se autofinanciar. Os preços não cairão no princípio, mas apenas não serão reajustados. Os investimentos caindo, decrescem o emprego, fazendo decair ainda mais o consumo. Mais tarde, quando a economia se aquecer, o empresário tentara recuperar o lucro que deixou de auferir no passado recente, repassando o custo do crédito ao consumidor final. Agora, se não houver esta queda na demanda por consumo (o que acontece apenas quando a taxa básica de juros atinge o gatilho de mais de 20% ao ano), o empresário ao invés de não reajustar os preços, passará ao consumidor qualquer aumento de custo que tiver (taxas de juros bancárias constituem-se em custo ao empresário).
Segundo: os títulos públicos de curto prazo são preferíveis aos de longo prazo (resultado do imediatismo nato brasileiro, iniciado desde o período inflacionário das décadas de 1970). Estes títulos são, devido ao prazo de vencimento, quase moeda, principalmente pelo fato de possuírem um grande mercado secundário. A troca de títulos por moeda quase não altera a situação de liquidez da economia. Agora, um agravante: grande parte destes títulos são não apenas remunerados pela taxa SELIC, como também reajustados diariamente pela variação da mesma, que necessita ser aumentada toda vez que se queira para viabilizar a troca de moeda pelos títulos. Resultado: quando se aumenta a taxa SELIC, se aumenta a riqueza dos que detém os títulos, e sendo estes como "quase-moeda", a liquidez da economia cresce em vez de diminuir.
Assim, o aumento da taxa de juros para conter a inflação tem dois efeitos, que se não tiverem efeito imediato, o terão num curto espaço de tempo: o aumento da liquidez e o aumento dos preços.”

O que deixei de explicar é o porque do aparente “sucesso” da política de metas para o combate à inflação, característica corroborada pelos fatos (a média anual da taxa de inflação de 1995-2002 foi de 12,5%, contra 4,5 nos anos de 2003-2007).

Uma parte dos custos de produção incorridos por um empresário, e que o mesmo leva em consideração ao precificar seus produtos, são os bens e serviços importados. Uma política de elevação da taxa básica de juros tende a atrair capital externo, causando a apreciação da taxa de câmbio (o que temos visto acontecer e, com maior força, no último ano e meio). Esta apreciação tende a tornar barata a importação de bens e serviços. Não há duvidas de que, desta forma, os níveis de preços deixarão de subir, ou subirão de forma lenta.

Conclui-se que o controle da inflação brasileira acaba sendo feita apenas por meio da taxa de câmbio apreciada. Inflação controlada é muito bom. Porém, a taxa de câmbio apreciada acaba deteriorando os efeitos das últimas desvalorizações cambiais sobre as exportações, além de aumentar as importações. Aliás, as exportações tem se mantido em níveis altos graças aos aumentos dos preços de produtos primários, pois em termos de quantidades, não cresceu muito.

O resultado deste processo será, principalmente quando os aumentos de preços dos produtos primários serem amenizados, de uma queda nas exportações, acompanhada pela atual ascensão das importações, levando o país novamente ao risco de um déficit em contas correntes. De que forma isto prejudicará o crescimento? A importação é um investimento: quando não se importam máquinas e equipamentos, se importam estoque para revender no mercado interno. Exportações maiores que importações significam que os empresários estariam pagando, com os próprios produtos, os investimentos em importados, um “autofinanciamento”. Quando isto não ocorre (ou seja, há um déficit no balanço comercial), os empresários buscam meios de consolidarem os empréstimos de curto prazo realizados para investirem inicialmente por meio de subscrição de ações, com debêntures ou por empréstimos, principalmente externos. No final da história, um déficit comercial, mesmo na ausência de um superávit na conta corrente, gera a necessidade de capitais externos, em termos de empréstimos. Estes irão gerar serviços de dívida externa que deteriorarão mais ainda a conta corrente.

A esta altura, mesmo que o balanço comercial volte a ser superavitário, enquanto o montante de endividamento externo for grande, o déficit no balanço de serviços pode tornar a conta corrente deficitária, por um longo período de tempo.
Solução para esta tendência? Redução das taxas de juros e desvalorização cambial.

Um comentário:

Lucas Mendes disse...

É preciso me convencer que este ferramental keynesiano é útil para explicar a inflação. Primeiramente, um erro típico do keynesianismo é entender que inflação seja uma alta no "índice de preços". Inflação não é o "aumento generalizado nos preços", como dizem nas faculdades e manuais, mas sim a depreciação do poder de compra da unidade monetária - algo bem diverso, portanto. Dessa forma, outra questão surge: o que causa a depreciação no poder de compra da moeda, i.e., o que causa a inflação? Resposta: o aumento na oferta de unidades monetárias. E quem pode fazer isto: o Estado, que é o monopolista da impressão de dinheiro. Em um contexto de livre mercado, onde não há expansão artificial da moeda, um aumento de preços setorial (digamos nos alimentos) não implica inflação, mas sim em aumento no preço RELATIVO dos produtos alimentícios. Todos os demais produtos da economia permanecem os mesmos. Porém, agora, as pessoas demandarão mais recursos para adquirir a mesma quantia de alimentos que antes, o que necessariamente implicará uma redução de consumo dos outros bens, pressionando seus preços para baixo, havendo, por fim, um ajustamento que não implicará num "aumento generalizado nos preços", simplesmente porque não ocorreu um aumento na OFERTA DE MOEDA. Porém, se o Estado quiser "salvar" a economia (como rezam os keynesianos), mantendo a prosperidade através da emissão de moeda, isto acarretará em inflação. Caso haja continuidade desta política, necessariamente decorrerá um período de expansão artificial (pois o crescimento não é sustentado em poupança, mas em notas de dinheiro pintado). Cedo ou tarde, o governo terá que rever este artificialismo com o aumento dos juros para refrear o conjunto de investimentos insustentáveis, por causa da própria inflação, que passa a corroer o poder de compra da moeda. Uma situação como esta de caos monetário acaba por refletir em todos os setores "reais" da economia e leva-a, necessariamente, à depressão - o remédio inevitável e previsível para arrebatar a euforia artificial causada pela intervenção estatal no mercado de crédito - supostamente feita para “salvar” a economia daquele desajuste nos preços dos alimentos.

Isto é, a solução keynesiana é como uma droga que quanto mais se injere acreditando que manterá o drogado eufórico e numa boa, no fim das contas estará conduzindo ele para o colapso. A economia é como um organismo, e a injeção artificial de moeda no sistema tem os efeitos de uma droga. Por isso, aliás, que na década de 1970, a economia keynesiana entrou em colapso, pois se deparou com um dilema insolúvel para seus manuais. O mundo vivia uma inflação com desemprego galopante. Daí, o certo ressurgimento dos economistas liberais: o keynesianismo hegemônico falhou e não tinha respostas para enfrentar uma crise jamais imaginada por seus economistas; todavia, previstas pelos bons porém desprezados economistas como Ludwig Von Mises.