segunda-feira, 12 de outubro de 2009

Tradução The Economist - "The nature of wealth"

Hoje em dia é complexa a definição do que é riqueza em termos reais e em termos financeiros. Este texto, "A natureza da riqueza", traduzido por mim, dá-nos um pouco de luz sobre a questão. O original, da revista The Economist, pode ser acessado em

http://www.economist.com/businessfinance/displaystory.cfm?story_id=14587262

Buttonwood

A Natureza da Riqueza

O mundo confundiu propriedades de origem financeira com as reais

No cerne da crise atual está a confusão fundamental sobre a natureza da riqueza. Pense nisso da perspectiva de um “marciano”. Fosse a um extraterrestre mostrado um quarto com lingotes de ouro, pilhas de notas de 20 dólares e uma série de números na tela de um computador, ele poderia ficar confuso em relação as suas funções. Nossa reverência por esses objetos pode parecer bizarra a ele como o comportamento do macho Construtor-de-Cetim (o qual decora o seu ninho com objetos brilhantes para atrair uma parceira) parece a nós.

Riqueza consiste de mercadorias e produtos que desejamos consumir ou de coisas (fábricas, maquinários e força de trabalho educada) que nos possibilitam produzir mais de tais mercadorias e serviços. Ativos financeiros surgem do desejo de postergar o consumo de forma que o dinheiro possa ser salvo, ou por motivos de precaução ou para investir com o objetivo de se consumir mais bens e serviços no futuro.

Visto dessa forma, o ativo financeiro não é “riqueza”, mas um clamor sobre a riqueza real. Se esses clamores multiplicam-se ou aumentam de preço, isso não significa que a riqueza agregada tenha aumentado. Se uma pizza é cortada em oito ao invés de quatro pedaços, não existe mais alimento a ser comido. Se a cada pessoa sentada na mesa dá-se frações de uma pizza, e o preço de cada fração aumenta de US$ 1 para US$ 2, a refeição continuará do mesmo tamanho.

A razão cabal pela qual o valor dos papéis (ações) cresce com o passar do tempo, por exemplo, é que elas estão ligadas aos bens e serviços produzidos pelas companhias. Ao passo que há crescimento da economia, ocorre o aumento das receitas de tais firmas. Assumindo que as margens permaneçam as mesmas com o passar do tempo, os lucros irão aumentar e, da mesma forma, o fluxo de dinheiro para os acionistas.

Essa verdade é obscurecida pelo ciclo econômico, a qual faz com que as receitas e as margens flutuem, e pelas vicissitudes do sentimento do investidor, o qual faz com que os pedaços (ações) sejam desvalorizados ou revalorizados (o retorno sobre o dividendo em alta e baixa). Um aumento no preço da ação que é conseqüência de um re-rateio não nos torna mais ricos no agregado, ao menos que o re-rateio represente uma predição acurada sobre uma melhoria na taxa de crescimento da economia no longo prazo.

No entanto, as pessoas utilizam a Bolsa de Valores como um barômetro da saúde econômica. Dessa forma, um aumento no mercado acionário pode ser (e tem sido) visto pelo governo e os banqueiros centrais como uma evidência que a economia está tomando o caminho certo. Isso pode conduzir a erros de política, como uma postura monetária frouxa, e mais exuberância irracional.

O mercado imobiliário é mais complicado do que o acionário, visto que as pessoas utilizam as suas casas (abrigo, relaxamento) enquanto, simultaneamente, tratam-nas como propriedades. Mesmo assim, um aumento no preço das casas que supere o crescimento econômico (em %) não torna a sociedade mais rica. Ao invés disso, tudo que é alcançado é a transferência de riqueza dos novos compradores para os aposentados que estão saindo do mercado de propriedades.

Na teoria, os preços dos imóveis podem aumentar mais rápido do que o PIB por algum tempo se os cidadãos decidirem devotar mais de sua renda para adquirir imóveis (por exemplo, eles podem preferir um apartamento maior a um carro maior). Na prática, é difícil separar tais mudanças estruturais da especulação que é proeminente em todos os booms de propriedade.

É a ligação entre a especulação e o preço das ações que explica a crise. A habilidade de se tomar emprestado dinheiro para comprar ações fomentou a subida dos preços das ações. E o efeito-riqueza sobre a valorização dos preços persuadiu aos países de língua inglesa a tomar emprestado dinheiro para sustentar o consumo.

Alguns meses atrás, A BBC transmitiu um programa sobre o uso do cartão de crédito. Um homem falou que se sentia “mais rico” porque ele tinha sido premiado com um limite de crédito de cinco mil libras (US$ 8,000). É claro que, assim que usou o cartão ele estava mais pobre. Não somente ele teve de pagar as 5 mil libras, como também a taxa de juros de dois dígitos. Similarmente, aqueles que compram uma ação supervalorizada com dinheiro emprestado não se tornaram mais ricos, mas sim, pobres.

Pensar sobre a riqueza dessa forma também é útil quando se tratando de pacotes de resgate para a economia. Essas propostas irão aumentar a quantidade de mercadorias e serviços que a economia produz no longo prazo, ou terão conseqüências que, na verdade, restringem a atividade econômica? Será que a política de quantitative easing realmente alimenta a criação de riqueza ou simplesmente cria mais “direitos” em relação a um conjunto de propriedades já existentes (especulação)?

Os bancos centrais estão repetidamente intervindo para salvar os mercados financeiros, ou riqueza de papel, nos últimos 20 anos. Mas eles levaram os preços a níveis que simplesmente não refletiam os fundamentos de longo prazo? Os esquemas engenhosos de John Law, um financista do século XVIII, para manter o valor das ações da trading do Mississipi não foram vitoriosos no final, por que o delta não era o El Dorado prometido aos investidores, porém um fétido lamaçal.

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