Como constatado nos últimos anos, somos líderes na exportação de produtos primários, especialmente no setor do agronegócio, destacando-se: açúcar, etanol, café, suco de laranja, fumo, carne bovina e frango. Com essa atitude, por meio do uso intensivo e eficiente dos campos, mantemos um nível de crescimento respeitável nesse setor (8% ao ano, desde 1997). A produção de bens primários em grande escala não garante, entretanto, que a nossa situação externa (balança de pagamentos) continuará no azul. Há preocupação, por parte de entidades como o FMI, que os países latino-americanos, em especial o Brasil, perpetuem a idéia de que a sustentabilidade agrícola indicará sucesso indubitável, o que não é verdade, pois os preços internacionais, quando do arrefecimento da demanda por parte dos asiáticos, irão diminuir a patamares preocupantes. Já que a tendência, agora sustentada pela expansão da coqueluche do etanol, é a de que o Brasil seja, definitivamente, uma "fortaleza agrícola", devemos nos preocupar com os entraves existentes ao setor. Esse texto, propõe reflexão sobre alguns indicadores de gargalos, sejam no curto, médio ou longo prazo.
- Com o passar do tempo, a posição do Brasil no mercado mundial, em se tratando da demanda externa se modificou substancialmente. No intróito, como a participação era amiúde ridícula em diversos setores agrícolas, o país era um tomador de preços (característica da concorrência perfeita e verificada, por exemplo, no mercado de futuros), isto é, era questão de baixar um pouco os custos que o produto veria sua demanda como infinitamente inelástica, não havendo limites a exportações. Agora, com toda a evolução, seja no tocante à estrutura de maquinário ou no processo produtivo, ocorre influência direta nos preços internacionais, o que acaba rebatendo no mercado interno.
- Mesmo com o câmbio desvalorizado (que prejudica a exportação), há a oportunidade vigente de utilizar a rentabilidade adquirida com a transação comercial para a atividade importadora de insumos. Entretanto, nesse ponto, a legislação infringe pesados impostos de diversas facetas (como Imposto de Importação e etc) à quem decida por essa política. Mesmo um defensor do mercado nacional, percebe que essa atitude acaba por prejudicar a empresa interna no longo prazo, vide perda de eficiência pelo comodismo (demonstrado agora por setores como o de calçados, têxteis que viveram a ilusão do lucro fácil no período de valorização do real).
- O giro de capital da agricultura é muito menor do que o da indústria (cerca de 210 dias), isto implica que, com os juros ainda elevados, o ônus do dinheiro (obtenção de empréstimos) acaba por retirar grande parte da rentabilidade do negócio, quando não o prejudica decisivamente. Temos de destacar também, que o pequeno agricultor e agricultora não recebem um acompanhamento consistente das entidades estatais e regionais e não dispõem de mecanismos de acesso à BM&F (Bolsa de mercadorias e futuros), aonde poderiam negociar contratos de longo prazo assegurando retornos mínimos sobre o que é produzido, uma questão de juízo e experiência. Outro ponto é o de que a dívida rural é gigante, respondendo por cerca de 70% do crédito aplicado nas atividades rurais (altamente imobilizado), isto é, quando você conseguir pagar o débito, poderá pensar em novo empréstimo. Para os bancos, não é tão interessante o crédito ao setor, o qual é principalmente executado por bancos como o Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal, de forte cunho estatal.
- Com o advento da Lei Kandir, não é cobrado o ICMS do produto primário destinado à exportação. Como o governo federal não é responsável no tocante à devolução do imposto não-cobrado, ocorre pressões, por parte do ente estadual, sobre o agricultor para que identifique seu produto com destino ao mercado interno (podendo assim cobrar o imposto). Além disso, dentro desse tópico, é prudente constatar a incidência de diversas espécies de tributos sobre a atividade falada aqui (contribuições, juros, encargos sociais), diminuindo nossa competitividade sobre nossos pares no exterior, como Argentina, Estados Unidos e China.
- Para comentar a questão do custo operacional (fretes) no tocante à questão agrária, recomendo a leitura interessante do texto de Luiz Antonio Fayet (através do link:http://www.revistacustobrasil.com.br/pdf/07/REP%2003.pdf), o qual resume, em um artigo realmente bem articulado, toda a questão logística pertinente.
Tendo em vista o que foi comentado acima, percebemos que os entraves ao setor primário não são simples de serem resolvidos e necessitam de continuada atenção e destinação dos investimentos públicos e privados. Afinal, uma quantidade considerável da massa "pensante" do Brasil acredita, inefavelmente (como Malthus, na Inglaterra do século XVIII), de que o futuro de nossa pátria reside no aumento considerável do setor de pouco valor agregado. Não é o meu caso.
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